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quinta-feira, 30 de julho de 2015

Conto poético: UM PORTEIRO DE SORTE



Cinelândia, Rio de Janeiro, idos de 1980.
Porteiro de uma casa noturna, Daniel 
conhecia todo o elenco de uma importante  companhia 
de  "teatro de revista".
Um verdadeiro espetáculo, que se repetia todas as 
noites, e em cartaz durante mais de um ano.
Dançarinos, músicos e atores de alto nível.
Mulheres lindas, como o espetáculo exigia !
Zélia, fazia parte do elenco, e sua beleza enlouqueceu 
Daniel.
Homem correto, trabalhador, dedicado ao seu modesto 
emprego, e morador da comunidade da Rocinha...
Trocavam olhares,  na entrada e na saída do Teatro.
 Ambos pareciam não ter coragem de tomar a iniciativa 
de um namoro.
Certa noite, ao fechar a cortina, para apresentação do
último ato, a encantadora Zélia  apresentou-se ao 
público, e  fez um breve relato sobre a sua  admiração 
pelo porteiro Daniel, pedindo-lhe em namoro.
O  felizardo estava sentado  à uma das mesas.
Ao ouvir o pedido da sua musa, desmaiou !
Só acordou com a intensa  manifestação do público 
que, de pé, aplaudiu o casal por uns três minutos.
Daniel foi contratado pela  mesma empresa,em que 
Zélia trabalhava, como contador de histórias de favela.
Passou a ser a atração principal, para orgulho  daquela  
atriz, com quem casou !



quinta-feira, 23 de julho de 2015

Conto poético:O ROGADOR DE PRAGAS




Esta Ilha encantadora, herdou uma cultura mística,
 muito variada.
Uma  população expressiva de macumbeiros,
benzedeiras, cartomantes e tudo mais.
A  imaginação dos "profissionais" não tinha limites.
Sapo com boca costurada, areia de cemitério,
eram alguns dos ingredientes para a realização
dos "trabalhos".
Mas, perversidade igual ao " rogador de pragas",
não se encontrava.
Nasceu dos sentimentos de inveja, ódio e vingança ...
O seu ambiente de trabalho era tétrico, mal iluminado, 
figuras demoníacas,  velas negras...
O rogador usava balandrau e chapéu negros, além 
de incensar o cubículo, provocando
um cheiro forte, insuportável.
Pronunciava palavras em dialetos incompreensíveis.
Um teatro macabro.
Ouvia as mágoas relatadas por alguém, e 
rogava pragas, desejando as mais variadas infelicidades, 
desde um incêndio, até a perda do emprego ou doenças 
graves.
O curioso é que isto acalmava o "cliente", pois
acreditava estar vingado, com o mal encomendado.
Quando a vítima ficava sabendo que seu nome
circulava na "boca do sapo", tratava logo de procurar
 uma "bruxa do bem", a benzedeira, para desfazer aquele "trabalho".
E, assim, esta população  viveu, durante centenas 
de anos, sob um manto místico e, quem sabe, até poético...

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Conto poético: CAÇADORES DE RAPOSAS




" Era uma vez "...
uma linda floresta, habitada por mansos e 
bondosos animais !
Toda aquela população trabalhava, dia e noite,
e sonhava ser feliz.
Havia uma perfeita organização social, onde todos
  contribuíam com uma parcela dos frutos
produzidos, em prol da coletividade, depositando
tudo numa grande caverna, bem segura.
Era uma enorme riqueza !
Mas, quem deveria ficar com as chaves daquele
precioso tesouro ?
Claro, só poderia ser um habitante que merecesse a
 confiança da maioria daquela população !
Mas havia, também,  raposas espertas, muito
espertas... mentirosas e ambiciosas.
Roubavam, até mesmo, a comida dos 
filhotinhos e o remédio dos animais velhinhos.
Pura maldade !
Pois não é que os animais,  enganados,
entregaram as chaves daquele  tesouro,
àquelas  raposas famintas e desonestas ? 
Sabem o que aconteceu ?
Levaram toda aquela riqueza para as suas 
tocas  particulares...  
Mas que ladrões !
Então, um leão negro, revoltado, mandou
alguns para a prisão. 
Foi aplaudido de pé, pela multidão !
Mas era tanto ladrão... tanto ladrão, que
faltou vaga na prisão !
E a caçada continua, pelas garras dos
gaviões,  até limpar toda a floresta...

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Conto poético: O PASSAGEIRO DO VAGÃO 40



É um dia assinalado, consagrado a todos 
os  Santos.
Também, véspera de outro dia especial,
dedicado aos que já partiram...
Flores e velas, perfumam e iluminam, com 
respeito e saudade !
Os sinos, no campanário, não economizam
garganta,  gritando sem parar.
O vagão 40  partiu faz tempo, com destino
 ignorado, mas sabendo onde chegar.
Pensativo, viaja um solitário passageiro.
Todos os Santos o protegem.
Observa e ouve tudo  por onde passa.
Mas o tempo, também,  passa.
Os anos correm noite e dia, sem parar, como
o trem sobre os trilhos.
Ele sabe disto, e se abastece das lembranças,
vivendo da esperança de um dia poder voltar.
Pela janela, observa a vida lá fora.
Parece viajar em círculo...
Algumas cenas se repetem, outras  não.
Neste vagão 40, não embarca mais ninguém.
Só o desembarque é permitido, ficando cada vez mais vazio.
E as estações vão se  aproximando, com menos pessoas
 a esperar,  até que não se escute mais
o ruído dos trilhos, nem o trem apitar...

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Conto poético: EU E O MAR



Ao entardecer, caminhei pelas areias
 da praia desta minha Ilha natal.
Dediquei-me a falar de amor, pensar em amor,
e nada mais... 
Um velho pescador, sentado em um pedaço
 de estiva, trazido pela maré da madrugada, chamou
a minha atenção. 
Senhor Maneca, meu amigo !
Estava  lá, tudo o que eu precisava
 para uma boa "prosa".
Chapéu  de palha à cabeça, escondendo o
penteado que já  partiu, faz tempo, mas
persistindo um  par de olhos azuis, legados
 pelos seus antepassados, vindos de Portugal.
Cumprimentos feitos, disse-me:
" Estou à beira deste mar há 89 anos, e muito
ligado a tudo isto.
Na madrugada, sem consultar o relógio, sei as horas
 somente pelo ruído das ondas, quebrando
na praia.
O grunhido das gaivotas noturnas, me informa
de onde o vento está soprando.
A voz grave do costão, me diz se a maré está 
enchendo ou  vazando.
Abrindo a janela do meu quarto, avisto o
 horizonte, onde estão as raízes da minha família.
Todos os dias viajo para lá, passeio entre
 a multidão, mas ninguém me reconhece.
Sinto-me invisível, parecendo um fantasma.
Este mar me conhece, e eu conheço este mar.
Falo a sua língua, sei de  todas as suas manhas. 
Sabe amigo, se eu  fosse alfabetizado, iria escrever
 muitas coisas lindas, que aconteceram
comigo e o mar !
E tenho um segredo que levarei para o túmulo,
pois não posso revelar à ninguém. "
Partiu para sempre. Não revelou o segredo que
mencionou, deixando-me muito pensativo e 
curioso.